Através do Disque 100, um serviço de utilidade pública, mantido pela sociedade sob gestão do governo federal, as denúncias contra crianças e adolescentes em 2016 foram 57% do total (76 mil). O registro só nos primeiros quatro meses de 2016 revelou que 31% das denúncias indicavam violência sexual contra adolescentes de 12 a 14 anos. Situações de negligência, violência psicológica, física e sexual são as violações mais comuns. Isso é triste e revoltante.
A denúncia anônima no Brasil tem aumentado, e por isso, estamos conseguindo visualizar um retrato mais real, contudo, sabemos que ainda estamos longe de conhecer o que de fato acontece com nossas crianças e adolescentes. Muita coisa não é denunciada, por medo de retaliação, por receio de “se meter na vida alheia”, pelas consequências para a criança e os envolvidos. A tragédia dos dados disponíveis não corresponde, infelizmente, ao tamanho real da violência sofrida, tantas vezes calada, por crianças e adolescentes em nosso país.
Segundo Irina Bacci, da Ouvidora Nacional de Direitos Humanos, grande parte das denúncias indicam casos que aconteceram no ambiente familiar: os denunciados são a mãe (13%), o pai (11%), o padrasto (11%) ou um tio da vítima (5%). Das relações menos recorrentes entre o suspeito e a vítima são listados também professores, cuidadores, empregadores, líderes religiosos e outros graus de parentesco, diz a Bacci.
Entendemos que a violência cometida pelas pessoas de maior importância afetiva na vida das crianças, ou seja, os mais próximos, produz um impacto muito maior e negativo do que a infligida por pessoas desconhecidas ou distantes emocionalmente. Esses traumas levam as crianças e adolescentes a interpretarem a si mesmos negativamente, o que lhes produz uma baixa autoestima. Por exemplo, uma criança passa a achar que ela realmente não vale nada, e que é parecida com uma barata esmagada que ninguém gosta, ou uma boneca suja que é jogada de lado. Outra pensa que merece ser castigada, e nem deveria ter nascido, se vendo como um pássaro com as asas quebradas, ou uma flor murcha.
As denúncias são importantíssimas, pois são elas que nos orientam sobre as políticas públicas de proteção, porém precisamos de mais agilidade e eficiência para captar dados e lidar com as informações. Não adianta sabermos o que acontece se a criança não é protegida. A burocracia e ineficiência das medidas protetivas são fatores que desestimulam a denúncia e mantém a violência velada em nosso país. Acredito que a impunidade também facilita a perpetuação da violência contra crianças e adolescentes. Precisamos interromper o ciclo de violência nos tornando responsáveis e corresponsáveis pelo bem estar de todas as crianças. Todos precisamos assumir a defesa de seus direitos sem medo ou receio.
Como ajudamos?
O Projeto Calçada desenvolveu uma metodologia a partir de estudos com crianças desde o ano de 1999, que as ajuda a falarem de seus traumas e a refletirem sobre si mesmas, mudando a sua percepção em relação ao que aconteceu. Contamos a elas de forma lúdica e interativa a verdade de que são especiais e valiosas, e ao se identificarem com personagens de histórias bíblicas que passaram por situações semelhantes e tiveram seus sentimentos melhorados, as crianças refletem sobre suas próprias vidas. Elas começam a compreender que apesar dos fatos ocorridos, elas não são aquilo que foram levadas a acreditar. Isso abre o caminho para que melhore a forma como se sentem e para agirem de acordo com uma autoimagem restaurada. Nos últimos 17 anos temos capacitado pessoas que trabalham diretamente com crianças e adolescentes em situação de risco, e seus familiares, que também passaram por traumas, para utilizarem essa metodologia que é conhecida como a Bolsa Verde, e os ajudarem de forma individual. Assim, é mais provável quebrar esse ciclo de violência.
É muito importante esse projeto, pois retrata a sociedade em que vivemos.
Que precisa urgentemente ser acolhida, e ter informação sobre esse tipo de violência.
É necessário um olhar mais claro sobre isso, uma sensibilidade maior de poder estar atento, a tudo que está. Nossa volta e tentar fazer a diferença.