A Ovelha Perdida

A Ovelha Perdida

A pandemia do coronavírus trouxe uma nova realidade, a do isolamento social. Todos temos lidado com isso, em especial aqueles que estão infectados com a doença, que ficam preferencialmente em um quarto, sem contato com as pessoas, sem pode tocar e nem ser tocado. Não poder partilhar da vida social em família e ficar confinado exige um rigor muito grande, um cuidado para não contagiar outras pessoas da casa. É sem dúvida um tempo estressante, doído, avassalador, ainda mais para as pessoas que gostam dessa convivência; todo mundo gosta na verdade, porém alguns mais e outros se satisfazem com um pouco menos. De qualquer forma é um tempo difícil, um tempo de saudade de se estar perto, mas por precaução e amor é preciso ficar longe. Temos ouvido das pessoas o quanto tem sido difícil ficar em isolamento e não é incomum surgir um sentimento de rejeição. Por prudência, mas também por medo, as pessoas se afastam.

Há uma história na Bíblia, uma das histórias da Bolsa Verde, que fala sobre uma ovelha que também esteve só e isolada em um determinado momento da vida. É uma história que Jesus compartilhou com as pessoas e queremos aqui refletir com você. Ela está no livro de Mateus 18:12-14.

Jesus narra o amor de um pastor pelas ovelhas, que, mesmo tendo cem, ao perder uma não se conforma, embora tivesse ainda noventa e nove ovelhas. Isso porque aquela ovelha tinha importância para ele. Ele tinha afeição pela ovelha, ele a amava; conhecia pelo nome e sabia o quanto que ela poderia estar se sentindo triste, os perigos que ela corria longe dos seus braços. Longe dos cuidados dele e das outras ovelhas, poderia estar se sentindo sozinha, triste, isolada. O pastor então, de forma muito rápida e arriscada, deixa as noventa e nove pastando naquele lugar e vai em busca da perdida.

Algumas pessoas acham que o pastor primeiro levou as outras ovelhas para o aprisco e depois foi em busca da perdida. Mas a Bíblia nos fala que ele deixa as noventa e nove ali pastando e vai atrás da ovelha que se perdeu, pois ela sofreria muito por estar sozinha e corria maiores perigos sem quem a protegesse. Ele foi atrás imediatamente, não demorou. Ele foi atrás porque aquela ovelha era importante, a Bíblia diz que ele procurou até encontrar. Muito maior alegria havia no coração dele por aquela ovelha que ele achou do que pelas noventa e nove que estavam seguras.

É bem interessante o sentimento que o pastor teve ao encontrar a ovelha, deixando claro a importância que ela tinha para ele. Imagine você como aquela ovelha se sentiu quando foi encontrada, em saber que alguém se importou, alguém foi ao seu encontro, empreendeu esforços para encontrá-la e a alegria de saber que não estaria mais solitária.
Essa é uma história de amor incrível e tem uma aplicação muito linda! Ao final da história Jesus afirma que: não é da vontade de Deus que nenhum dos seus pequeninos se perca. (14).

Você que está em isolamento, seja ele qual for, com muitas restrições que são importantes de serem seguidas, mas que causam um efeito no coração muito doído; você não está sozinho. Há uma pessoa que pode entrar no seu quarto, na sua casa. Há uma pessoa que pode chegar até você. Há uma pessoa que pode sentar do lado da sua cama, segurar a sua mão e dizer: olhe para mim, você pode falar o que está no seu coração porque eu estou ouvindo e interessado em saber como está seu coração. porque eu me importo com você. Eu vim até aqui porque eu me importo com você.

Jesus hoje está entrando no seu espaço, onde você está. Ele está entrando na sua casa, com passos tranquilos, mas firmes, indo para dentro do quarto onde você se encontra. Ele abre a porta e sorri para você. Ele te abraça, te acolhe e diz que você não precisa ter medo que ele está ao seu lado, que não precisa se sentir sozinho porque ele está contigo. É o Deus pessoal, o Deus Emanuel, o Deus que se fez carne para habitar entre nós (Jo 1.14). Ele sabe o valor de uma boa companhia e você hoje pode desfrutar da companhia dele, pode falar para ele o que está no seu coração, o que o inquieta, o que amedronta você. Como aquela ovelha que poderia ter tantos medos: do lobo, do penhasco, do frio, da fome, tantos outros medos e você, certamente, também tem os seus. Fale agora para ele. Ele é o pastor que pode proteger você, que o encontrou. Ele ficará ao seu lado o tempo que necessitar ficar em isolamento social. Jesus permanecerá com você. Ele prometeu. (MT28.20).

A LUTA PELO LUTO

A LUTA PELO LUTO

“Chorai com os que choram…” Romanos 12.15

A pandemia que estamos enfrentando nos tem feito experimentar algo que nunca havia sequer passado pelas nossas mentes ser possível: não poder velar e sepultar os nossos mortos. Participei de dois velórios durante este tempo de isolamento social. Testemunhei a dor da perda ser sublimada pelo medo. No lugar dos abraços, acenos com a cabeça. Pela primeira vez em minha vida vi as condolências serem abafadas pela máscara higiênica.

Rápido, controlado e frio. Assim são os velórios em tempo de quarentena. Muito semelhante aos tempos de guerra, que ouvimos muitas vezes nossos avós nos contarem. Ouvi histórias de rasgar o coração neste tempo de enfrentamento do coronavírus. Pais que não puderam se despedir de seus filhos. Cônjuges que não conseguiram dar o último beijo. Abraços interrompidos. Declarações de amor suspensas. Luto cruel.

Enquanto escrevo, minha mente é invadida pelas histórias da Bíblia. Jesus chorando a morte de seu amigo de quem não pôde se despedir. Comovido pela dor de Marta e Maria. Compadecendo-se plenamente na alma. Identificando-se profundamente com o aflito. Ninguém deveria enfrentar a morte de quem ama sem a dignidade de poder se despedir. Eu sei que há várias culturas que enxergam a morte com outros olhos, mas o ocidente chora e chora muito, porque dói demais a separação de quem nos é querido. Eu sei por que já velei meus mortos. Tive liberdade para chorá-los. Tive tempo pra recordar histórias. Ouvir palavras confortadoras. E acompanhar o cortejo silencioso até o sepulcro.

Tempos difíceis.

Para você que chegou comigo até aqui e que sabe exatamente do que eu estou falando por ter vivido esta tragédia quase insuportável, meus sentimentos e meu total respeito por sua perda. Queria poder invadir sua mente e seu espírito e enchê-los de paz nesse instante. Queria ordenar à saudade que não te machucasse mais. No entanto você e eu sabemos que não posso fazer nada disso. Me cabe então sugerir. Só sugerir.

Viva um dia por vez. Ponha pra fora essa angústia. Um passo de cada vez. Devagar. Não tenha pressa. Lute com calma pelo teu luto que não foi permitido. Não se culpe. Não se esconda. Feche os seus olhos, respire bem fundo e concentre-se nas preciosas memórias que te trazem alegria. Então seja grato. A gratidão é a melhor de todas as despedidas. Ela pode ser percebida no olhar. Num sorriso. Num suspiro.

Não é uma receita. É um desejo. Uma oração. Pra que você encontre a paz que todo teu ser quase exige pra sobreviver. Jesus sabe o que é isso. Ele também chorou. E acredito que esteja chorando ao seu lado por te ver sofrer.

Confie sua dor a Ele. Tente.

Com amor, lágrimas e esperança de que seus dias sejam cheios de graça e bondade, me despeço na certeza de que Deus fará por você, por mim e por nós muito mais do que sequer imaginamos.

Marcos Davi Ferreira de Andrade

Casado com Andréa Andrade desde 1993, pai de Giovanna e Arthur e Davi. Formado em bacharel em teologia pelo Centro de Estudos Teológicos dos Vale do Paraíba, pós graduado em Filosofia pela Faculdade de Ciências Sociais Fênix de Brasília e mestrado em estudos bíblicos pela ABECAR em Mogi das Cruzes. Pastoreia a Igreja Batista no Jardim das Indústrias, mantenedora do Projeto Calçada e parceira em aconselhamento com a Bolsa Verde.